“Senhores passageiros, próxima paragem: Ovar” – Por Pedro Nuno Marques
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Ali, dentro do comboio, a voz feminina da CP inicia a folia: “Senhores passageiros, próxima paragem: Ovar”, diz. O interior da carruagem encontra-se esgotado de povo faminto de diversão. Muitos são aqueles que se fazem ostentar por garrafas de plástico contendo algumas misturas de bebidas que ajudarão, parece, a manter o ritmo carnavalesco noite dentro. A maioria das pessoas encontra-se fantasiada. Todas elas buscam entrar de maneira bem-disposta no Carnaval da “vitamina da alegria” vareira.
Ali, à saída da estação, um mar de gente ruma coordenada Ovar adentro. Entre ruas e ruelas, a cidade transforma-se numa espécie de meca do Entrudo de uma região. Caminha-se, bebe-se, confraterniza-se até se chegar aos pontos fulcrais onde as mais variadas iniciativas que a ocasião proporciona têm lugar.
“Só espero é que não chova!”, “Oh, pá… preciso urgentemente de um sítio para fazer xixi!”, “Caramba, acabei de ver a minha ex-namorada com um tipo vestido de rinoceronte africano!”, escuta-se aqui e acolá.
Ovar, em apenas três ou quatro dias, vê a sua massa populacional crescer umas cinquenta vezes. Por todo o lado, sente-se o cheiro a bebidas destiladas, cerveja, pipocas, algodão doce, cachorros e hambúrgueres. Há excessos naturais, mas a cordialidade e camaradagem prevalecem perante tudo. É a essência cabal de um Carnaval ancestral, dos principais do país.
Ali, música e mais música. Em todo o lado se ouve sonoridades actuais e outras intemporais. A malta dança com garra e necessidade de sentir a folia e a festa acontecerem. Ao fundo, um casal de namorados discute por um motivo trivial. Os amigos não querem saber, porque, segundo afirmam, “é normal, estão sempre a discutir”.
Adiante. A festa prossegue até praticamente o dia raiar. Regressa-se, por fim, ao comboio, em estado mórbido e olhos preenchidos de cansaço por horas agitadas. Num canto da carruagem, o casal de namorados acima mencionado dorme ferrado, ela no ombro dele e ele de cabeça encostada ao banco do comboio, ambos sentados. Parece que a chatice (ou birra) foi de curta duração. E ainda bem. Os amigos dos catraios tinham razão.
Pedro Nuno Marques