Lusodescendente revisita o 25 de Abril em livro
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Paul Christopher Manuel é lusodescendente e fez um doutoramento em ciência política na Universidade de Georgetown, Washington, nos Estados Unidos, em 1990, que resultou em vários trabalhos sobre a transição e a consolidação democrática em Portugal após a Revolução dos Cravos.
A partir das entrevistas a 14 militares de Abril, foi editado este novo livro na coleção “O 25 de Abril Visto de Fora”, iniciativa da Comissão Comemorativa 50 anos 25 de Abril em parceria com a editora Tinta-da-china, juntando ensaios de vários historiadores portugueses e estrangeiros como Luís Nuno Rodrigues, Stewart Lloyd-Jones, Nancy Bermeo, David Silva Pereira, Douglas Wheeler e Maria Inácia Rezola, comissária executiva da Comissão Comemorativa 50 anos 25 de Abril.
Os entrevistados foram divididos, por Paul Christopher Manuel, entre “reformistas” (António de Spínola, Manuel Monge, Casanova Ferreira e Jaime Neves), “moderados” pró-Europa (Vítor Alves, Fisher Lopes Pires, Vasco Lourenço, Costa Neves, Garcia dos Santos), radical pró-Europa de Leste (Vasco Gonçalves), “populistas”, de tendência terceiro-mundista (Otelo Saraiva de Carvalho e Mário Tomé) e “independentes” (Costa Gomes e Carlos Fabião).
No preâmbulo, Nancy Bermeo escreve que estas 14 reflexões dão “uma visão clara da espantosa diversidade” entre os militares envolvidos no golpe e na revolução, do “desastre que foi evitado”, numa referência a uma eventual guerra civil, e “dos modos de pensar que foram ora penalizadores ora facilitadores de um final feliz” no processo revolucionário.
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Nas entrevistas, os militares responderam, em 1990, “quando os dias agitados da revolução já tinham passado, mas os acontecimentos era suficientemente vívidos para serem recordados com algum pormenor”, a uma lista de perguntas, por exemplo, sobre o 11 de Março, a tentativa de golpe de direita que ditou a guinada à esquerda da revolução, ou o 25 de Novembro, o confronto entre a esquerda militar e os chamados “moderados” que ditou o princípio da consolidação democrática.
Três figuras centrais da revolução, Costa Gomes, membro da Junta de Salvação Nacional (JSN), que se tornou Presidente da República após a demissão de Spínola, Vasco Gonçalves, coronel do Exército que foi primeiro-ministro no Verão Quente de 1975, e Otelo Saraiva de Carvalho, estratego do golpe de 25 de Abril, têm opiniões muito diferentes sobre se Portugal esteve ou não à beira de uma guerra civil em 1975.
“Tenho muitas dúvidas”, respondeu Vasco Gonçalves a Paul Christopher Paul, apesar de reconhecer que houve “ações contraditórias que poderiam conduzir a isso”, um período de “grande agitação, de afrontamento entre as forças conservadoras e as forças de progresso”.
Costa Gomes disse que o país “nunca chegou à beira da guerra a não ser na tentativa, absolutamente gorada, do Plano da Maria da Fonte” – forças de extrema-direita, algumas ligadas à ditadura, que lançaram ataques à bomba contra forças e partidos e esquerda e extrema-esquerda.
E Otelo Saraiva de Carvalho tem uma opinião mais taxativa: “Só tive noção clara de que podíamos estar na iminência de iniciar uma guerra civil, como primeira confrontação entre militares, na própria manhã do 25 de Novembro.”