Cultura

Leandro Ribeiro: "Apoios camarários que temos tido são parcos"

Leandro Ribeiro encena e adapta o original “Pupilas do Senhor Reitor”, do Júlio Dinis, que hoje estreia no palco do auditório do edifício da junta de freguesia de São Vicente de Pereira, em Ovar.

Quais são as expectativas para esta estreia?
As expectativas do público são altíssimas… Temos lotação esgotada para três dos cinco espetáculos agendados para a nossa sede. Esperamos receber cerca de 500 pessoas em apenas 5 sessões, vindas dos mais diferentes pontos do país.
A nossa expectativa e responsabilidade está exponencialmente aumentada pela homenagem que queremos prestar a Júlio Dinis, tencionamos estar à altura da sua escrita e da sua visão.
Assiste-me um tremendo comprometimento apresentar um trabalho que muito tem de familiar às gentes de Ovar, que é alimento das suas tradições, é baseado em alguns factos reais de Ovar no ano de 1863.
Como se trata de uma história do conhecimento geral e de leitura obrigatória na escola, corro um maior risco de defraudar a expectativa e a curiosidade dos espectadores, mas, acredito que a adaptação que fiz mostra bem a essência do original e a interpretação vem reforçar o estilo da época, com um toque contemporâneo através da encenação.
Por fim, outra grande expectativa é a de nos conseguirmos aproximar das entidades governantes desta cidade, revelando a qualidade do Sol d’Alma, para que possamos ser parceiros em várias atividades.

Que critérios presidiram à escolha da peça?
Este ano comemora-se os 150 anos da passagem de Júlio Dinis por Ovar. Além disso, em 2012 (ano em que fiz esta opção), foi o bicentenário do nascimento de João José da Silveira, um médico da terra, imortalizado por Júlio Dinis, com a personagem de “João Semana”. Com a inauguração do Museu Júlio Dinis – Uma casa ovarense, achei interessante levar à cena “As Pupilas do Senhor Reitor”, prestando a devida homenagem a Júlio Dinis e à literatura portuguesa.

Influenciou o facto de Júlio Dinis ter ligações a Ovar?
Sim. A ligação de Júlio Dinis a Ovar é imortal, por esse mesmo motivo, na minha adaptação, criei duas situações diferentes: por um lado, conto resumidamente a história de “As Pupilas do Senhor Reitor”, por outro, coloco na trama, personalidades reais da história de Ovar, nomeadamente: Júlio Dinis, a sua sobrinha Anita (por quem nutria uma amizade especial), a sua tia Rosa Zagalo (proprietária da casa onde ficou alojado durante a sua permanência em Ovar e atualmente o museu de Júlio Dinis) e por fim Ana Simões (por quem se julga ter tido um romance).
Assim juntas no palco: a ficção e a realidade, que a dado momento, se irão cruzar na história, sem que uma anule a outra. O próprio Júlio Dinis fará parte da sua própria novela, como ator, já que também ele fazia teatro nos seus tempos académicos no Porto.
De certa forma, tentarei contar um pouco do que foi a estadia de Júlio Dinis por Ovar e brincar com o público, confundindo-o entre o que é real e o que é ficção.

Como está o Sol d’Alma?
O Sol d’Alma tem 12 anos de vida e completará 3 anos como Associação autónoma. Neste momento, encontra-se de perfeita saúde, com equipas de atores e técnicos invejáveis a qualquer grupo de teatro.
Estamos em fase de crescimento. Em cada espetáculo novo nota-se evolução a todos os níveis. Somos reconhecidos pela qualidade do nosso trabalho e não pela quantidade de produções ou espetáculos exibidos.
Este trabalho, por exemplo, foi já alvo de uma reportagem televisiva e fui contactado por um produtor de teatro profissional, para levar esta peça a algumas escolas do norte do país. No entanto, gostaria de projetar este trabalho em parceria com a Câmara Municipal de Ovar.
O Sol d’Alma tem horizontes bem definidos e um objetivo bem delineado, que passa pela projeção do nome da sua freguesia e de Ovar, bem como, levar cultura à população vicentina e vareira.

 

Onde funciona? 
A sede do Sol d’Alma é em S. Vicente de Pereira, no edifício da Junta de Freguesia, num auditório apetrechado pela Associação, com palco, plateia e bancada, com capacidade para cerca de 100 pessoas.
O horário de atendimento é às sextas-feiras das 21:30h às 00:00h e aos sábados, das 11:00h às 12:30h. Acolhemos com alegria, a qualquer altura do ano, todos aqueles que queiram experimentar o teatro e posteriormente fazer parte de um dos 2 elencos, desde que maiores de 6 anos.

O Sol d’Alma também tem componente de formação?
O Sol d’Alma possui dois grupos distintos, ambos com a componente formativa: o grupo principal, de jovens e adultos, com formação contínua durante todo o ano (sem férias) e que por norma, faz a sua estreia entre Outubro e Novembro e uma oficina de teatro infantil, para crianças dos seis aos doze anos de idade, resultando também num espetáculo final em Junho de cada ano. Todos os elementos recebem formação relacionada com interpretação, movimento e voz.

O que se distingue o Sol d’Alma de outras companhias do concelho, como a Contacto ou a Renascer?
Cada qual tem o seu espaço, a sua linguagem e o seu método de trabalho e todos eles vivem à sua maneira o teatro. O que nos une, além do gosto pelo teatro é o querer levar o nome do concelho mais longe. De resto, parecem-me ser bem diferentes.
Não sei ao certo o que nos distingue, mas sabemos bem qual a nossa filosofia, que passa por dar a oportunidade a todos os elementos do grupo a participarem ativamente na peça final de ano como atores. Ou seja, não escolho os atores mediante a peça que quero desenvolver, deixando pessoas de fora, mas ao contrário, escolho um texto que se adapte ao elenco que possuo, independentemente do seu grau de maturidade, empenho e vocação. Acho importante que todos tenham a oportunidade de experimentar apresentações em público, pois só assim poderão crescer como atores. Daí os nossos espetáculos terem sempre muitos elementos em cena, dificultando a nossa itinerância, pois envolve mais despesa com transportes e alimentação, mas só assim faz sentido para nós.
Outro aspeto importante, é o de anualmente fazer uma atividade pontual diferente, que não se repete todos os anos. O Renascer e a Contacto possuem um festival de teatro no mesmo período de tempo. O Sol d’Alma promove outro tipo de eventos e sempre direcionado ao público em geral e Associações de teatro. Por exemplo, no seu primeiro ano de vida enquanto Associação, realizamos um debate sobre a importância do teatro na construção da cidade, tendo como palestrantes convidados, uma psicóloga, um arquiteto, um político e um encenador e ator de teatro profissional – Almeno Gonçalves. Já no ano seguinte, realizámos uma atividade de formação com atores profissionais, apenas para atores amadores do nosso concelho, na expectativa de envolver as outras Associações de teatro de Ovar e assim estreitar laços. Também temos realizado sessões de cinema infantil e filmes portugueses antigos. O cinema é uma área do ator, tendo por base o teatro. O Sol d’Alma não se centra apenas no espetáculo de teatro em si, mas em tudo que esteja diretamente relacionado com o exercício do ator. A nossa aposta passa sempre pela surpresa, pela novidade, pela formação e partilha.

Que tipo de apoios tem ou gostaria de ter?

Tenho de confessar que até à data, os apoios camarários que temos tido são muito parcos e em nada semelhantes aos atribuídos às outras Associações de teatro do concelho. Aguardamos que este ano, com o novo executivo, as diferenças sejam minimizadas, para que tenhamos a oportunidade de fazer mais e melhor. Também esperamos um maior apoio da atual Junta (união das freguesias), já que agora, Ovar passou a ter mais um grupo de teatro.
É fundamental que a distribuição dos subsídios seja feita de forma justa, compensando o trabalho de um ano. O trabalho que desenvolvemos em S. Vicente de Pereira é vital para os seus habitantes, pois somos a única Associação cultural no ativo, dando ofertas de espetáculos aos vicentinos e outras atividades de interesse cultural.
No entanto, temos o apoio da população, comércio e indústria local, que nos tem vindo a ajudar com pequenos patrocínios. Além disso, temos cerca de 120 sócios auxiliares, que simpatizam com a Associação e ajudam na execução das atividades.

Quantos atores tem o Sol d’Alma?
Atualmente, o Sol d’Alma possui 23 elementos ativos no grupo juvenil/adulto e 10 elementos na oficina infantil. Todos eles são oriundos de várias freguesias de Ovar. Há atores que ali estão desde a sua fundação, em 2002.

Têm uma sede (palco) própria para desenvolver o vosso trabalho?
O Sol d’Alma tem à sua gestão, um espaço cedido pela Junta de Freguesia de S. Vicente de Pereira. Este espaço não possuía vida própria nem condições de utilização. O Sol d’Alma, no seu primeiro ano como Associação executou obras, dotando o espaço com um palco para espetáculos, adquiriu equipamento de som e luz, cortinas e bambolinas e recentemente executou bancadas para o público, pensando no seu conforto. No entanto, ainda não temos as condições ideais, pois nos falta um espaço digno de camarim e balneários próprios e sala de reuniões.
Temos dado um passo de cada vez, no sentido de ver o auditório com melhores condições físicas e técnicas. Tudo o que fazemos até à data, é com a certeza de que podemos executar, com o fruto do nosso trabalho.

Como diretor artístico e encenador desta Associação, está sozinho nesta tarefa, de dinamização cultural da freguesia, pelo Sol d’Alma?
Felizmente, eu conto com uma equipa técnica muito profissional, da minha extrema confiança. Quando lhes peço uma determinada tarefa, sei que ela será executada da melhor forma possível. Quero aqui destacar duas pessoas, que sem eles, o meu trabalho seria impossível de ter a qualidade que julgo ter, são eles: Marta Baldaia, que desenha e executa na perfeição todo o trabalho de cenários, adereços, figurinos das peças, bem como, é a responsável pela imagem da Associação, de excelente design; o outro, e não menos importante, o meu amigo António Alves, que está sempre pronto a colaborar, nos serviços relacionados com a luz, som, transporte, logística, etc. Além deles, tenho ainda uma direção ativa, composta por pessoas que partilham do mesmo gosto pelo teatro e que têm o sentido da responsabilidade. Por fim, posso afirmar que possuo o melhor elenco do mundo. Tenho atores e atrizes, que apesar de amadores, dão a alma e o corpo por este projeto. Obrigado a todos.

Já se pode falar em novos projetos (além deste)?
Para o próximo ano, 2014, o Sol d’Alma irá realizar uma mostra de teatro inter-geracional, dando a oportunidade à população vareira, de durante um mês, assistir a espetáculos de teatro interpretados por elementos de todas as idades, desde infantil, juvenil, adulto e sénior. Temos já contactos encetados nesse sentido e cremos que esta fórmula poderá ter sucesso.
Quanto às novas produções, tenho ideia de encenar um texto de Alves Redol com as crianças da oficina infantil, e relativamente ao grupo adulto, apesar de ter já uma ideia, é ainda segredo dos deuses.

 

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