Fechou-se no cerco sanitário para ajudar os outros
Após duas semanas em teletrabalho, Adriana Maia deixou o conforto e a segurança (relativa, é certo) da sua casa em Avanca, no concelho de Estarreja, e sitiou-se dentro do cerco sanitário de Ovar para poder desenvolver melhor a sua actividade. “Estava a tornar-se incomportável trabalhar na área social a partir de casa”, conta a técnica que decidiu mudar-se temporariamente para Ovar, de forma a poder “estar presente e agilizar o trabalho de proximidade junto das pessoas”.
Abdicou da companhia dos seus familiares, mãe e avó, consideradas pessoas de risco, para estar na linha da frente no apoio a quem mais precisa.
A trabalhar na área social da União das Freguesias de Ovar, São João, Arada e São Vicente de Pereira (UFO), até ao dia 28 trabalhou por telefone, “sempre em concertação e em rede, distribuindo cabazes com bens alimentares por famílias que iam sendo sinalizadas junto do Gabinete de Crise da Câmara Municipal de Ovar e IPSS´s”, explicou.
A partir do dia 30, quando se confinou voluntariamente, Adriana Maia diz que conseguiu fazer muito mais: “Foi possível ir para o terreno, perceber as dificuldades e/ou necessidades e tentar colmatá-las e minorá-las”.
Em parceria com a Delegação da Cruz Vermelha de Ovar, a UFO constituiu uma rede de 21 voluntários, sendo que 16 estão apoiar estas entidades no terreno e 5 a apoiar a UFO, a partir de casa. A estes voluntários, providenciou-se seguro, identificação e os meios de protecção necessários para estarem salvaguardados no terreno.
Adriana Maia fica sensibilizada quando fala do rasto de solidariedade que tem sido conseguido: “Todos juntos, conseguimos já apoiar 57 agregados familiares, o que corresponde na totalidade a 142 pessoas, residentes no território da UFO”.
As tarefas não páram com a entrega de cabazes com bens alimentares de primeira necessidade, como carne, peixe, legumes, fruta, leite, leguminosas, massas, cereais e bolachas, a famílias que devido à cerca sanitária viram os seus rendimentos reduzidos drasticamente. “Algumas pessoas ficaram em situação de desemprego, na sequência desta pandemia”, alerta a assistente social. “Outras ficaram sem qualquer meio para puderem subsistir, outras têm rendimentos manifestamente insuficientes para conseguirem suportar todas as despesas e alimentar as crianças, além dos que eram apoiados por familiares residentes fora do concelho de Ovar e, com o cerco, deixaram de ter esse auxílio”.
Para além do apoio alimentar, “temos vindo auxiliar vários agregados familiares e pessoas idosas, com medicação crónica e medicação prescrita para infectados com o covid19, bem como outros apoios pecuniários, sempre que solicitado e devidamente justificado”.
Tudo começou quando a UFO lançou um número de telemóvel (964 757 901) e um e-mail ([email protected]) destinado a recolher apoios e voluntários. “Para ajudar as pessoas mais idosas ou infectadas com o Covid-19, sem rectaguarda familiar, na aquisição de compras, medicação, entrega de refeições, assuntos burocráticos, como seja, por exemplo, pedir receitas electrónicas, agilizar o pedido do pagamento de pensões, entre outros”, aponta.
Os cinco voluntários em teletrabalho estão em contacto com vários seniores no intuito de perceber como se encontram e se precisam de ajuda em algum sentido. “Através destes contactos, detectámos algumas situações de fragilidade económica, social, solidão e desespero, pelo que temos vindo a falar, regularmente, com eles para tentar dar-lhes conforto e alguma calmaria neste momento que tanto nos assombra”, descreve Adriana Maia, que procura não deixar ninguém para trás.
Dá-se igualmente o caso de muitos infectados que têm procurado apoio junto do serviço social da UFO. “Algumas situações ligam-nos e procuramos saber se necessitavam de algum auxílio e apoio logístico, e aqui, também, foram detectadas situações de pobreza envergonhada e um apelo, pela primeira vez, aos serviços aos quais nunca tinham recorrido”.
As equipas de voluntários da UFO também fazem visitas a casa de pessoas idosas, isoladas e referenciadas por esta entidade, como sendo situações que carecem de um apoio mais próximo e contínuo.
“Tem sido um trabalho árduo e não se avizinha o seu fim, mas a UFO está aqui e estará, para, dentro dos seus recursos humanos e financeiros, apoiar e diligenciar todas as solicitações”. Adriana Maia agradece a todos que ajudam a rede mas há um grupo de pessoas, em particular, que tem uma saudação especial, pois doou um montante, directamente para o Supermercado Vieiras, para auxiliar quem mais precisa e tem o nosso reconhecimento e agradecimento”.
Agradecimentos também à “Farmácia Central, ao Supermercado Vieiras, aos técnicos das outras Entidades, e em especial à Cruz Vermelha de Ovar e a todos os nossos voluntários porque têm sido incansáveis e sempre disponíveis” e um “agradecimento especial ao casal que me cedeu um apartamento no Furadouro”, conclui
O presidente da UFO, Bruno Oliveira, expressa o seu agradecimento a Adriana Maia e à equipa de voluntários, “porque sem eles, não seriamos capazes e não conseguiríamos continuar no terreno”.
TESTEMUNHOS
[20:42, 15/04/2020] Sandra Nascimento (voluntária): No que me diz respeito, está a ser uma experiência muito gratificante! A receptividade das pessoas tem sido excelente ☺️
[20:45, 15/04/2020] Xavier Freitas (voluntário): Vale pelos sorrisos, tímidos, envergonhados, mas sinceros das famílias e pessoas ajudadas… Faz-nos ganhar o dia 🌈
[21:57, 15/04/2020] Arlete Leite (Presidente da Cruz Vermelha Portuguesa – Ovar): Obrigado pela disponibilidade dos voluntários desde a primeira hora para ajudar no que fosse preciso…
[22:01, 15/04/2020] Alexandre Sousa (voluntário): Para mim é o espírito de missão, numa altura de dificuldades. Não se pode esperar que uma organizado como a UFO consiga fazer tudo sozinha, assim é nossa obrigação colaborar. É verdade que os olhares de quem ajudamos são uma boa recompensa.