Estou apaixonado – Ricardo Alves Lopes
Isto do amor não é fácil de descrever, tem muitas nuances, uma incomensurável série de factores que varia de pessoa para pessoa, mas também tem traços gerais, pontos comuns a todos. E, para mim, descrevendo o amor, haverá sempre uma palavra na calha, para além de todas as outras: orgulho.
Sim, para mim, o amor tem muito de orgulho. Temos orgulho de estar ao lado daquela pessoa, temos orgulho da pessoa que ela é, temos orgulho de tudo o que faz e ficamos vaidosos de partilhar a vida com ela. É assim, ou não é?
Eu acho que é muito assim. E eu, não sendo um rapaz de amores fáceis, mas sendo um rapaz de encantamento rápido, consigo perceber que a minha fase de encantamento por Ovar já passou.
Agora, neste preciso momento em que vos escrevo e em tantos outros, compreendi que encantamento era o que eu tinha aos quinze anos e aos dezasseis, que não conhecia nada, não via nada do que se criava e levava a cabo além-fronteiras, e por isso Ovar parecia-me a melhor cidade do mundo, impossível de abandonar.
Hoje em dia, isso é muito diferente. Tive a felicidade de poder começar a viajar um bocadinho, conhecer outras cidades, outros modos de vida, relacionar-me com pessoas encantadas com a sua cidade, como eu era com Ovar, até que comecei a entrar numa fase que me deitava com ela, com a cidade, mas mesmo assim a pensar nela. Sabem quando a mulher que nós amamos, aquela que nos aquece o coração, adormece no nosso peito, mas, mesmo assim, não conseguimos parar o movimento cerebral e estamos a pensar nela, a olhá-la a dormir, a passar-lhe a mão nas feições do rosto, e a pensar no que amanhã poderemos fazer de diferente para ela ainda sorrir mais?
Pronto, é assim que me tenho sentido em relação a Ovar. Desde que para aqui comecei a escrever, e já não vai há tão pouco tempo assim, comecei a sentir que não bastava ser morador, que precisava de pensar mais sobre a cidade, investir algum do meu tempo nela, mais que não fosse para deixar-vos aqui algo de interesse e relevância, porque, afinal, isso já não seria um mau contributo. Fazer-nos pensar sobre nós, quando não estamos a agir bem, pode ser a maior ajuda que nos dão. Mas não foi esse o caso.
Dia após dia, a cidade foi-se, passe a expressão, portando cada vez melhor, acolhendo cada vez melhor a ideia de que o futuro somos nós que o fazemos, e assim eu fui-me sentindo cada vez mais inútil, mas cada vez mais apaixonado.
Não vou falar do espetáculo de Reis, da candidatura do mesmo a Património Imaterial da Cultura, ou do fantástico espetáculo de Abertura do Carnaval de Ovar, com o Tim Steiner e, essencialmente, com as nossas gentes. Como não vou falar da maravilhosa tarde transmitida na RTP, que nos encheu de orgulho e vaidade, e colocou pessoas a rodos, em frenesim, a circular pela cidade. Quase todos os pontos aqui referidos já foram mencionados pelo, não posso esconder, meu querido Henrique, que trata as palavras com uma solenidade que eu invejo. Arrepia-me, e isso só os grandes é que conseguem.
E esse arrepio que os textos do Henrique me proporcionam são, somente, um dos exemplos de tudo o que esta cidade me tem feito sentir. O encantamento acabou, agora é amor. Vou ao Porto, vou a Lisboa, a Barcelona ou a Paris, e não digo que moro perto do Porto: digo que moro em Ovar. E isso é amar. Com orgulho.
Ricardo Alves Lopes (Ral)
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