Ovar mais pobre – Ricardo Alves Lopes
As perdas não são sentidas por todos de igual modo, isso é um dado adquirido e compreendido. Não posso iludir-me, esperançado que todos sintam os mesmas coisas que eu, que todos tenham os mesmos gosto e ambições, sob pena de isto tornar-se uma monotonia.
Assim, a tristeza que hoje sinto é para muitos incompreendida e até desfasada, do que são realmente as coisas importantes da cidade, mas eu não consigo deixar de senti-la. Estamos a poucas horas de perder a única livraria de que a cidade dispunha. A Book It, no Modelo, é, em parte, uma livraria, e é gerida e tornada por algumas pessoas que conheço e de quem gosto, mas não é uma livraria, é um conceito maior onde cabem livros e outras coisas mais. É bom para Ovar tê-la, mas para mim não é igual a ter uma livraria. A Bertrand também é filha de uma megalomania consumista, de um país que se tornou filho de shoppings. Não é uma livraria de centro de cidade, com alguns escaparates empoeirados e um proprietário de setenta e muitos anos, com mais livros lidos do que tem à venda, mas é uma livraria. E a única que existia em Ovar.
Nunca fui, certamente, o consumidor mais assíduo da loja, mas sempre tive os meus timings de passagem pela loja, a minha vontade de conhecer novos livros, de recrutar para minha estante alguns dos clássicos, muitos dos que hoje aparecem como novas vozes da literatura e para isso sempre tive uma ajuda fundamental. As pessoas que davam o rosto pela Bertrand de Ovar sempre foram de uma generosidade que fazia desta livraria especial. Posso acorrer a ela no Gaia, no Norte, ou onde for, mas em nenhuma delas terei o bairrismo de cá. Todas as pessoas que deram o rosto pela Bertrand de Ovar fizeram de uma loja de shopping, de uma loja feita para ser uma fonte abissal de receitas, uma pequena livraria de bairro. E isso não pode ser esquecido. Nunca.
Quando digo que a cidade ficará mais pobre, digo que se perde um conceito de proximidade ao livro, pelas vozes dos rostos que ofereciam uma opinião, uma ajuda, uma disponibilidade, que engrandece a nossa viagem pelos livros. Fiquei com pena e quis usar este espaço para referi-lo. Não pretendi fazê-lo por abuso deste espaço, para estampagem de tristezas pessoais, desejei apenas honrar as pessoas que fizeram da Bertrand de Ovar uma loja exemplar no atendimento ao cliente. Eu sempre fiquei satisfeito e isso não podia guardar só para mim.
Assim, é um espaço que se finaliza, na nossa cidade que está em crescimento, mas com a certeza que mesmo os negócios de nicho podem ser exemplos. Ovar fica mais pobre, mas os que gostam de ler continuarão a ler e os que aproveitaram o atendimento da nossa livraria continuarão a ter essa recordação. Ficam os meus desejos de sorte para todos os que fizeram a Bertrand de Ovar e a esperança que um dia voltemos a ter uma livraria na nossa cidade. Os livros merecem e nós também.
Ricardo Alves Lopes (Ral)
http://tempestadideias.wordpress.com
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