Empreendedorismo Social – Pedro Coelho
Tendo acedido ao convite dos Rotários de Ovar para usar da palavra, neste encontro e versar nele uma matéria à minha escolha, resolvi seleccionar o tema EMPREENDEDORISMO SOCIAL.
A razão da escolha, não decorre do facto de ser um especialista na matéria, mas sim, porque, o tema reúne um conjunto de circunstâncias, que do meu ponto de vista, o torna adequado a este encontro.
Desde logo, porque fala de empreendedorismo e esse termo é facilmente associado a natureza da minha actividade profissional e, nesta qualidade, a de alguém que, também, é um empreendedor.
E, fala de social cujo tema, a mim, me é particularmente sensível, porque o exercício de funções públicas, que tenho desempenhado, quer como cidadão, quer, como autarca, me deram uma sensibilidade particular neste domínio.
Por outro lado, é matéria central na acção do movimento Rotário e por conseguinte, entendi, que se adequava para os que se encontram envolvidos com este movimento.
Assim, e depois desta explicitação prévia, da selecção do tema, aproveito para partilhar convosco um pouco daquilo que penso, que analisei e do que se produz neste domínio. Não sendo um especialista nesta matéria, nem querendo sê-lo, procurarei, modestamente apresentar um conjunto de análises e sobretudo auxiliar na divulgação e sensibilização para o empreendedorismo social.
O Empreendedorismo Social resultará de uma sumula de circunstâncias, nas quais de uma forma mais directa se poderá colocar o facto de se ter vivido uma crise económica com as consequências daí resultantes de aumento do desemprego, dificuldade económica das famílias e instituições, diminuição da geração de oportunidades.
Se quisermos, perante este cenário, deveria ocorrer aquilo em que a sociedade acreditou que teria construído neste período pós segunda guerra mundial, que era, um estado assistencialista e capaz de dar uma resposta perante as dificuldades, protegendo os cidadãos nos seus momentos de maior vulnerabilidade.
Mas, a realidade e a circunstância em que a generalidade dos países se encontrava, Portugal incluído, impossibilitava de serem esse “guarda-chuva” que todos esperavam.
Estaria o modelo social do estado em questão?
E a resposta veio da sociedade, através de iniciativas e de organizações mais ou menos formais, que sentindo os problemas sociais e a incapacidade e impossibilidade do estado de responder assertivamente às necessidades, reage, tornando-se mais solidária e reinventando-se na forma do fazer.
Dá-se visibilidade a um modelo já à muito existente em alguns países, que é o da EMPRESA SOCIAL. Este modelo, existente, por exemplo, desde 1976 no Bangladesh, através do Banco Grameen e da solução do microcrédito.
A empresa social tem como missão ajudar os pobres, ajudando-os a sair da pobreza. Com uma forma de actuar, em que, os ajuda a criar as condições mínimas para que, possam desenvolver uma actividade que lhes assegure um rendimento e com isso, uma melhoria da sua qualidade de vida.
Tem como princípio básico, ainda, o facto de os investidores apenas recuperam o capital que investem. Não centra a sua actividade na geração de um benefício para os accionistas mas no reinvestimento do benefício gerado numa solução para as pessoas.
É verdade que cada sociedade a seu modo, através de instituições e/ou grupos de pessoas, sempre gerou iniciativas nos mais diversos campos, que, com mais ou menos alcance, foram resolvendo problemas sociais locais, regionais ou mesmo nacionais.
Esta necessidade de saber o que o que é feito no país, assim como, da sua possibilidade de replicação a outros beneficiários levou a que em 2008, a IES – Social Business School desenvolvesse, no concelho de Cascais, um projecto inovador de investigação-acção denominado ES+, com a missão de identificar e apoiar iniciativas de empreendedorismo social a nível local, que contou com o apoio do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) e a Câmara Municipal de Cascais.
Os critérios de selecção das iniciativas de elevado potencial de empreendedorismo social basearam-se em cinco características fundamentais:
Forte Missão Social – resolvem-se problemas sociais importantes e negligenciados da sociedade…
Potencial de Impacto – transformando mercados, comportamentos, políticas públicas e as dinâmicas na sociedade e/ou no ambiente.
Capacidade de Empoderamento Local e Inclusão Social – envolvendo e capacitando os beneficiários e outras partes interessadas.
Potencial de Inovação e de forma Sustentável – através de novas soluções baseadas em modelos de funcionamento eficientes e viáveis que desafiam a visão tradicional e que permitem resolver problemas da sociedade com uma eficácia superior relativamente às soluções alternativas existentes…
Potencial de Crescimento – com a preocupação e capacidade de escalar a solução e/ou se disseminar através de replicação.
Esta iniciativa foi-se estendendo a outras zonas do país e hoje está criado pela mesma entidade o MIES – Mapa de Inovação e Empreendedorismo Social, tendo na sua primeira fase mapeado o Alentejo, o Centro e o Norte do país.
O MIES permite-nos perceber o amplo leque de iniciativas que podem ser levadas a efeito, por enquadramento em 24 áreas de acção, do alívio à pobreza ao voluntariado. E, dentro de cada área, existem múltiplas iniciativas para trabalhos específicos a públicos-alvo, tão diversos como podem ser comunidades específicas, faixas etárias concretas, género, etc.
Como esta, outras iniciativas surgiram, como:
Laboratório de Investimento Social – Uma iniciativa do Instituto de Empreendedorismo Social e da Fundação Calouste Gulbenkian, numa parceria com a Social Finance UK e o Laboratório de Investimento Social. Esta iniciativa foi lançada em Fevereiro de 2014 e o objectivo é dar aos empreendedores e empresas sociais melhor acesso a fontes de financiamento.
Programa de Apoio a Empresas Sociais – Criado pelo Banco de Inovação Social (BIS) da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o Programa de Apoio a Empresas Sociais tem como objectivo a criação de empresas sociais que respondam, de forma inovadora e sustentável, a necessidades sociais identificadas como prioritárias pelos parceiros do BIS. São privilegiadas as áreas da saúde, acção social, património e cultura.
Prémios FAZ – Resultante de uma parceria entre a Fundação Calouste Gulbenkian e a COTEC Portugal – Associação Empresarial para a Inovação, os Prémios FAZ integram duas iniciativas: o Prémio Empreendedorismo Inovador na Diáspora Portuguesa e o concurso Ideias de Origem Portuguesa. Este último tem como missão convocar os portugueses que vivem e trabalham fora de Portugal a contribuir com ideias para projectos de empreendedorismo social que constituam novas e melhores respostas aos atuais desafios sociais que o país enfrenta.
Iniciativa Portugal Inovação Social – A nova Iniciativa Portugal Inovação Social é um instrumento financeiro europeu que vai disponibilizar 150 milhões de euros, no âmbito do Fundo Social Europeu, para apoiar instituições e projectos de empreendedorismo social. Criar soluções para problemas fundamentais de caracter social (pobreza, envelhecimento, abandono escolar precoce, baixas taxas de empregabilidade e carência de estruturas de apoio para crianças e famílias) é o principal propósito da Iniciativa Portugal Inovação Social, que se integra no conjunto de fundos previstos no Portugal 2020.
O que é que diferencia um empreendedor de um empreendedor social?
O empreendedor para além de um conjunto de características intrínsecas, de capacidade, de preparação, de domínio de conhecimento, é detentor de uma atitude que o faz acreditar e superar a dificuldade.
O empreendedor social é aquele que reunindo os predicados anteriores, o faz em prol da sociedade que o rodeia, resolvendo constrangimentos da mesma, com a capacidade de contagiar os que estão em seu redor.
A diferença entre empreendedorismo social e caridade e/ou voluntariado está na criação de valor, e na criação de condições de sustentabilidade à iniciativa.
Permitam-me partilhar convosco a percepção do que é o empreendedor social, para algumas instituições de renome mundial:
– School for Social Entrepreneurship (Reino Unido) – “É alguém que trabalha de uma forma empreendedora, para um benefício público ou social, em vez de ter por objectivo a maximização do lucro. Os empreendedores sociais podem trabalhar em negócios éticos, organizações públicas ou privadas, em voluntários ou no sector comunitário. Os empreendedores sociais nunca dizem “não pode ser feito”.
– Canadian Center for Social Entrepreneurship (Canadá) – “Um empreendedor social é inovador, e possui características dos empresários tradicionais como a visão, a criatividade e a determinação, as quais aplicam e focam na inovação social. São líderes que trabalham em todos os tipos de organizações.”
– Schwab Foundation for Social Entrepreneurship (Suíça) – “Os empreendedores sociais são agentes de mudança da sociedade mediante:
i) A criação de ideias conducentes à resolução de problemas sociais, pela combinação de práticas e conhecimentos de inovação, criando assim novos procedimentos e serviços;
ii) O estabelecimento de parcerias e meios de autossustentabilidade dos projectos;
iii) A transformação das comunidades através de associações estratégicas;
iv) A utilização de abordagens baseadas no mercado para resolução dos problemas sociais;
v) A identificação de novos mercados e oportunidades para financiar uma missão social.”
– Institute for Social Entrepreneurs (EUA) – “Empreendedores sociais são executivos do sector de negócios sem fins lucrativos que prestam maior atenção às forças do mercado sem perder de vista a sua missão social, e são orientados por um duplo propósito: empreender 15 programas que funcionem e que estejam disponíveis para as pessoas, tornando-as menos dependentes do governo e da caridade.”
– ASHOKA (EUA) – “ Os empreendedores sociais são pessoas visionárias, criativas, pragmáticos e com capacidade para promover mudanças sociais significativas e sistémicas. São indivíduos que apontam tendências e apresentam soluções inovadoras para problemas sociais e ambientais.”
– Erwing Marion Kauffman Foundation (EUA) – “Os empreendimentos sem fins lucrativos são o reconhecimento da oportunidade de cumprir uma missão para criar, de forma sustentada, valor social, sem se apoiar exclusivamente nos recursos.”
Fruto do meu conhecimento do nosso Concelho, diria que nós temos muitos empreendedores e empreendedores sociais, o que não temos, é uma identificação e uma referenciação, dos mesmos, enquanto tal e por isso, teremos a tentação de pensar que, esta capacidade é uma realidade distante do nosso território e que será necessário olhar para o país inteiro para identificar alguns casos esporádicos. Veremos que não é bem assim.
No nosso Município
Segundo o MIES em Ovar existe já uma iniciativa de empreendedorismo e inovação social que é o projecto SURF AT NIGHT. Este projecto teve o seu inicio em 2008 e é promovido por uma entidade privada, cujo empreendedor é Nuno Amaro, com intervenção na área de Iniciativa Lúdica e/ou Cultural e/ou Desportiva, e com outras áreas de intervenção no Turismo e no Desenvolvimento Económico.
O Problema Identificado foi a Necessidade de dinamizar a Vila Piscatória de Cortegaça combatendo o Isolamento e falta de oportunidades dos seus habitantes.
Está referenciado como, o primeiro evento de surf à noite com concerto musical a nível mundial. É um evento aberto, inclusivo, que tem a preocupação de criar actividades para todas as pessoas de qualquer idade, com ou sem limitação física.
Por parte da Câmara Municipal de Ovar, esta, estabeleceu no âmbito do programa DLBC – Desenvolvimento Local de Base Comunitária, 3 contractos que visam, especialmente, promover, em territórios específicos, a concertação estratégica e operacional entre parceiros, orientada para o empreendedorismo e a criação de postos de trabalho.
Os objectivos são:
Promover uma resposta aos elevados níveis de desemprego e índices de pobreza, através da dinamização económica local,
Revitalização dos mercados locais e da sua articulação com territórios mais amplos e, em geral, da diversificação das economias locais
Estímulo à inovação social e à busca de novas respostas a problemas de pobreza e de exclusão social em territórios desfavorecidos em contexto urbano e em territórios rurais ou costeiros economicamente fragilizados ou de baixa densidade populacional.
Ainda, por parte da Câmara Municipal de Ovar está em orçamento o desenvolvimento no concelho de uma parceria com programa EPIS – Empresários Pela Inclusão Social, cujos valores e programa de acção, são:
Proposta de valor social
A EPIS quer ser uma referência nacional no desenvolvimento, incubação e internalização de novas metodologias de promoção do sucesso escolar, da qualidade dos sistemas de ensino e formação, e da empregabilidade e inserção profissional dos jovens em Portugal.
Lucro social
Metodologias inovadoras e assentes em boas práticas, com escalabilidade nacional;
Aliança estratégica e de proximidade com as instituições de Governo Central, nomeadamente, as responsáveis pela Educação, pela Formação e pelo Emprego;
Parcerias em rede com autarquias, escolas e empresas nacionais e locais;
Incubação da mudança no terreno com resultados quantitativos;
Promoção da internalização da mudança pelo Estado e pelas autarquias, com base no princípio da “universalidade de serviço”.
Investimento social
Investidores empresariais e institucionais comprometidos com a sustentabilidade da EPIS numa perspectiva de longo prazo;
Alavancagem do investimento de incubação com parceiros locais e institucionais;
Exploração de modelos de autofinanciamento dos projectos.
E com a apresentação deste último projecto no qual a Câmara Municipal se encontra envolvida, espero, muito sinceramente, que a minha abordagem a este tema tenha sido do vosso agrado e sobretudo tenha suscitado, em vós alguma curiosidade pelo assunto e seja proporcionador de uma multiplicação de projectos de inovação e empreendedorismo social no nosso território, auxiliando à resolução dos problemas de grupos concretos que se encontrem em situação de carência.
Pedro Coelho
(O autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico)